Big Brother...
“A ignorância é a mãe de todos os males”.
François Rabelais (1483-1553) Escritor e Padre Francês)
A antropóloga
Lilian Schwacz escreveu um ótimo livro chamado “O império das festas e as
festas do império”. Nesse livro ela faz uma descrição das procissões e festas
que Dom Pedro II e a corte realizavam no Brasil colônia. A descrição que ela
faz é interessante, mostrando que essas festas beiravam o ridículo. Ela
observou que a partir daí a cultura brasileira é de pão e circo. O Brasil lembra
a Roma que tinha seus espetáculos de gladiadores que se matavam na arena para o
delírio do povo. Havia também a queima de hereges em praça pública. Hoje a
versão pós moderna disso são os chamados “Reality
Shows”.
De início é
bom lembrar que o Big Brother, não é uma “tara” brasileira, sintoma do nosso
subdesenvolvimento cultural. É sem dúvida, mais uma peça cultural da
globalização, além de uma “tara” da natureza humana em geral. É uma idéia
originalmente Holandesa, que se espalhou no mundo como uma praga. Aqui no
Brasil, depois de uma briga entre Globo e SBT pelos direitos autorais, o
programa alastrou-se chegando atualmente a sua décima edição. Todos querem olhar pelo buraco da fechadura e
dar uma “espiadinha”. Entre e “espie” a vontade. São expressões usadas por
Pedro Bial apelando para a inerente curiosidade da natureza humana.
Os denominados
reality shows tem sucesso por causa
do fascínio que o outro, seja lá quem for, nos provoca. Num psicologismo
barato, somos atraídos pelos erros dos outros, até porque nos identificamos com
eles. Adoramos observar, condenar, julgar, somos extremamente severos com
determinados erros dos outros. É a lógica do “quanto pior melhor”. Eles
descobriram o mapa da mina: “quanto pior melhor”. Soaria estranho falar em humildade,
mansidão, temperança, castidade, fidelidade, afinal o pecado é muito mais
atraente e sedutor do que virtude. O
erro atrai e desperta a curiosidade porque revela as dimensões escondidas, as
doenças ocultas das pessoas como nós. Rubem Alves diz que todos nós, por
amarmos mais os pecados do que as virtudes somos seres que existem em conflito,
somos nossos próprios adversários. Dentro de nós existe um ser amordaçado,
mascarado, recalcado, proibido de fazer e dizer o que deseja[1].
Em meio a essa
situação, o reality show é bom
mecanismo de fuga por meio do qual as pessoas podem realizar suas fantasias para
tornar o dia a dia menos miserável. Essa espetacularização[2] tem
uma natureza mórbida porque revela o que há de pior na natureza de cada ser
humano.
Além do mais
puro interesse de criar audiência, há os interesses dos fabricantes de móveis,
edredons, carros, produtos diversos. O show então se completa. Quem é o
beneficiado? Em princípio todos ganham. A rede de TV e os anunciantes que tem o
único objetivo de faturar. Ganham também as cobaias (artistas), os anunciantes
e a patuléia que assiste. As cobaias
(artistas) que se prestam a isso estão querendo uma oportunidade de aparecer.
Os famosos cinco minutos de fama. Pelado, vestido, tramando, dando rasteira, dando
golpes, traindo, jogando, exibindo nádegas, bíceps, o que seja, o negócio é
aparecer. Já a platéia telespectadora fica babando, ensandecida pelo sangue,
suor e lágrimas rolando da televisão. E sexo. Porque pimenta nos olhos dos
outros é refresco, e dá IBOPE. É juntar a fome com a vontade de comer.
E nós, através
da TV, internet, telefone, elegemos quem perde e ganha, quem vive e quem morre.
Não precisamos mais matar gladiadores na arena. Somos modernos. Vivemos na era
da globalização, da comunicação, da cibernética. Evoluímos. Não precisamos de
arenas porque toda a nossa tecnologia está a serviço do golpe, do ciúme, da
trama, da rasteira no concorrente, da dissimulação, do falsear, da
instrumentalização das amizades e das pessoas.
Estamos no auge
da falência da cultura e da educação. Trocamos
a família por dezenas de horas de puro deleite de como ser falso, mentiroso,
infiel, hipócrita, leviano, canalha, com todos os derivativos da falta de ética
e imoralidade estando à mostra.
Como disse um
amigo, o verdadeiro significado de BBB é: Bendita
Burrice a Brasileira.
Enquanto a
sociedade der audiência a esse tipo de patifaria televisiva, a falência da
família e dos valores morais e éticos não vão mais retroceder. Será isso é o
melhor podemos produzir culturalmente?
[1] ALVES, O
que é Religião? 1981, Ars Poética editora, São Paulo, SP
[2] Conceito
filosófico relativo a forma de cultura de uma sociedade que sobrevive do
espetáculo, principalmente relacionado aos outros seres humanos.
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